Se existe uma coisa que me revolta é ver uma mãe insistindo para a criança pequena tomar refrigerante. Já vi essa cena algumas vezes em restaurantes, em fins de semana. Às vezes, a criança nem quer mais, mas a mãe empurra o copo com canudinho até ela sugar tudo até o fim. Com o mesmo afinco com que insiste com a colherada de sopa de legumes ou mais um pedaço de abóbora. Como se fosse nutritivo. Como se fizesse bem para a criança. Pra quê? Todo mundo sabe que refrigerante é carregado de açúcar, corante e outras substâncias desnecessárias ao nosso organismo. É só ler a embalagem, está tudo escrito lá. Todo mundo sabe que açúcar engorda. Todo mundo sabe que a obesidade infantil é um problema crescente de saúde no Brasil. E bebidas com edulcorantes artificiais não são recomendadas para crianças. Então... pra quê?
Uma pesquisa da GfK sobre o consumo de bebidas não alcoólicas, realizada em julho de 2008 e divulgada esta semana, mostra que os refrigerantes sabor cola são o quinto produto mais ingerido dentre todas as bebidas sem álcool mais consumidas pelo brasileiro. No topo do ranking, segundo a pesquisa, está a água. Sucos naturais de frutas feitos em casa ficaram em oitavo lugar. Em volume de líquidos ingeridos, a pesquisa Liquemetrics mostra que o refrigerante é o segundo maior na média, perdendo apenas para a água. Quando separado por faixas etárias, o consumo de refrigerante aparece em 50% das crianças entre 1 e 5 anos e em 66% das crianças de 6 a 11 anos. O maior consumo de refrigerantes acontece na adolescência: mais de 70%.
O refrigerante parece estar dotado de uma aura de tradição que as pessoas não querem abandonar. Quem já foi a uma festa de aniversário de criança em que não houvesse refrigerante? Soa impensável. Talvez tão impensável quando não dar presentes. Pois ele está lá, com seu lugar garantido ao lado dos também indispensáveis brigadeiros e salgadinhos fritos. As guloseimas gordurosas e açucaradas parecem ter se transformado naquele convidado que não pode faltar, senão a festa fica sem graça. E é justamente nessa associação que eu acho que mora o perigo. Dia especial = diversão = junk food? É isso que estamos ensinando às crianças?
A responsabilidade dos pais é tamanha na formação dos hábitos alimentares dos filhos que, nos Estados Unidos, onde a obesidade afeta um terço da população e não poupa crianças, as autoridades já estão radicalizando. Algumas crianças americanas com obesidade mórbida já foram afastadas de suas famílias em razão da incompetência dos pais em fazê-las perder peso. Na Grã-Bretanha também já houve casos. Um cara chamado Tam Fry, presidente da Fundação Britânica para o Crescimento da Criança, está tentando mudar a legislação para classificar a alimentação exagerada como forma de abuso infantil.
Será mesmo preciso chegar a esse ponto?
Ao dar uma festa de aniversário para os filhos, os pais estão ensinando como comemorar uma passagem da vida, como se divertir, como compartilhar. A criança está crescendo e aprendendo a fazer escolhas. É o momento de ela eleger os brinquedos favoritos, os amigos favoritos e até as comidas favoritas. Todo mundo sabe - porque os especialistas vivem dizendo e porque todos temos memória - que o que a gente gostava de comer quando criança vai influenciar nossos hábitos alimentares na vida adulta. Então por que não aproveitar a festa para oferecer oportunidades de escolhas que façam bem à criança? Não será mais interessante ela tomar como favoritas as escolhas mais saudáveis?
Consultei a chef Fernada Sayeg, dona do bufê Snob Food, que faz comida chique para adultos e crianças. Ela acredita que as festas saudáveis sejam uma tendência, embora estejam acontecendo mais nas famílias ricas, por enquanto. Fernanda diz que nessas festas mais requintadas as opções são mais variadas. Quem não quer os salgadinhos de sempre pode aguardar que o garçom traga os quitutes mais nutritivos. E ela diz que não é difícil conseguir que a criançada avance na ala saudável do cardápio. Quando a comida é bem feita, gostosa e bem apresentada, com enfeitinhos coloridos, o sucesso é total.
A meu pedido, Fernanda fez uma lista das comidinhas bacanas que podem encantar as crianças e nutri-las ao mesmo tempo entre uma brincadeira e outra. Entre elas:
- bastões de cenoura com molhinho de queijo
- batatinha de carinha assada
- espetinho de tomate cereja com mussarela de búfala
- gelatina
- papinha de manga
- pamonha
- espetinho de morango com calda de chocolate
- saladinha de frutas
- sopinhas frias ou quentes
- sanduichinho de frango desfiado com cenoura e maionese
- milho cozido...
A mim parece perfeitamente possível organizar uma festa infantil bonita, divertidíssima e saudável, que as crianças adorem do mesmo jeito. As nossas lembranças de infância certamente ajudarão nesse projeto. Ou as receitas da vovó. Ou as receitas da internet mesmo. Eu acrescentaria à lista da Fernanda o que eu gostava de comer nas férias enquanto assistia à Sessão da Tarde: canjica, pinhão, pipoca, bolo de banana e outras delícias caseiras. Quanto ao refigerante, embora ele estivesse também presente nas minhas festas de aniversário, eu preferiria, hoje, substituí-lo por bebidas saudáveis e talvez ainda mais refrescantes, como sucos naturais de frutas de cor bem bonita. Entre minhas preferidas está o suco de erva cidreira com limão, que conheci num evento escolar. É preciso encontrar um maço da erva com folhas bem verdes, de preferência colhidas no dia, batê-las no liquidificador com água e limão e reservar na geladeira. Fica lindo e delicioso. Gosto também de chá mate gelado feito em casa. Esse é mais fácil: basta comprar o chá solto, sem ser em forma de sachês, preparar com água quente e pôr pra gelar. Sem muito açúcar, por favor.
As crianças são capazes de gostar de muitas coisas. E a primeira coisa a fazer para elas ampliarem seu repertório alimentar é oferecer tudo que há de bom. Assim, aumentam as chances de elas fazerem associações do tipo comida saudável = gostoso = especial.
(Francine Lima, Época)
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